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sábado, 22 de dezembro de 2007

BEZERRA NETO
Jornalista e escritor
E-mail:
bzneto@gmail.com

O trem de ferro

Semana de 06 a 13/10/2007
O levante militar de 64 o retirou dos trilhos, deixando a pobreza sem o seu mais adequado meio de transporte. As velhas estações, como que ainda esperando a sua volta, permanecem nas cidades como lembrança – retratos vivos do passado; verdadeiros cartões postais são elas, ao lado do quadro Estação de Ferro Central do Brasil, de Tarsila Amaral, pintura evocada no poema de Manoel Bandeira – Trem de Ferro. Todos nós, interioranos da geração dos anos sessenta, vimos de algum lugar o trem passar a correr sobre trilhos, para lá e para cá, soltando fumaça, silvando e matraqueando: “café com pão, café com pão, café com pão”. E lá se ia o trem de ferro na sua costumeira e mansa velocidade, mas contundente: - “Vou danado pra Catende, vou danado pra Catende/ vou danado pra Catende/ com vontade de chegar”... “O sino bate, o condutor apita o apito, solta o trem de ferro um grito, põe-se logo a caminhar”. O maquinista acelera; o foguista bota mais fogo na fornalha. E lá vem o trem de volta. O governador Teotonio Vilela Filho vira maquinista e vem trazendo o trem de volta; Luciano Barbosa é foguista e bota lenha na fornalha, bota mais fogo na máquina, e o trem é conduzido de volta às Alagoas, às terras de Arapiraca. Haverá muito progresso e o produtor rural vai poder escoar a sua produção de milho, feijão... Leio o poema de Bandeira, Trem de Ferro, onde ele aborda uma temática muito comum à vida nordestina: “o trem é mais que uma máquina e símbolo de modernidade na esfera social; um simples meio de locomoção. É esperança de vida melhor”. Reflito: o progresso vem de trem. Quando não se tinha televisão, via-se o mundo através da janela do trem. O foguista bota fogo na fornalha/ a fumaça voa/ o homem pega o trem e voa na fumaça. Corre um mundão de léguas e volta ao mesmo lugar. – Quanta saudade!... Acho até que todos nós – saudosistas – de certa forma sempre estivemos esperando o retorno aos trilhos do trem de ferro de nossa infância... nossa lembrança. O trem de ferro vem com vontade de chegar. Agora sim/ Café com pão/ Agora sim/ Voa, fumaça/ Bota fogo na fornalha, seu foguista/ Ai seu maquinista / Não deixa o trem descarrilar! Foge, bicho, Foge, povo/ Vai depressa ver o trem passar... – Penso: fui menino vivendo os dias e as horas de saída e chegada do trem à estação, o movimento da gente que chegava e da gente que embarcava. Guardo isso na lembrança e acho que, quando o trem apitar novamente na curva, voltando, eu estarei lá para matar a saudade.

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